Em Hamlet Machine, os subterrâneos são incomparavelmente maiores do que a superfície. O mundo apresenta-se-nos desconstruído. As paixões humanas são matéria incandescente na escrita de Heiner Müller. Uma enorme solidão: “Retiro-me para as minhas entranhas”.
Em Hamlet-Machine, o cenário são “as ruínas da Europa”. A história, em Heiner Müller não é um documentário de televisão, é sentimento em carne viva.
Alucinação: um homem, autor teatral da RFA, organiza um encontro de Hamlet, herói trágico shakespeareano, com a própria tragédia do mundo do seu tempo, um Hamlet em plena luta de classes. “Um final trágico”. “O meu lugar, caso o meu drama se tivesse realizado, seria dos dois lados da frente…”.
Este espetáculo é também um encontro. De linguagens teatrais normalmente dissociadas. De sinais. De criadores cúmplices com o universo teatral de Heiner Müller. De intérpretes de carne e marionetas de metal com um texto de uma grande contemporaneidade, ao mesmo tempo uma reflexão sobre a história, um drama de uma existência sofrida: “Dever-se-iam coser as mulheres, um mundo sem mães”.
Depois, uma paragem, talvez a morte. “Quando ela atravessar os vossos quartos de dormir com facas de carniceiro, conhecereis a verdade”.
Isabel Barros, João Paulo Seara Cardoso